sábado, 16 de novembro de 2013
Macabea, mais uma paixão!
A leitura do livro de Clarice Lispector "A Hora da Estrela", me fez apaixonar-me ainda mais pelas palavras. Pelos dircursos e decifrações segundo um autor ou uma autora podem fazer. Do ínício ao fim da leitura, me encontrei completamente envolvida na história de uma pobre moça que pensava ser feliz.
Pensar em ser feliz. Muitos pensam e acreditam que desfrutam da plena felicidade. Mas que felicidade é essa? O que o faz ser feliz? O que significa felicidade nesse mundo chamado planeta Terra? Perguntas, perguntas e mais perguntas, sobre a felicidade me rondam a cabeça. Ao passo em que eu mesma me pergunto, felicidade pode ser considerada passageira, momentânea ou eterna?
Felicidade.
Um pequeno momento de silêncio. Fecho os olhos e me vejo deitada em um jardim de flores amarelas e azuis, sentindo apenas o cantar dos pássaros, enquanto o brilho do sol ilumina meu rosto e eu esqueço tudo o que me faz mal. Esqueço e me desligo um pouco do mundo. Que mundo? Mundo ou o meu universo. Em que me sinto, sobrecarregada. De que? Pode ser clichê, mas de mim mesma. As vezes nem eu me aguento. Sobrecarregada da vida. Do trânsito, do estresse, da falta de paciência, da falta de amor e felicidade plena das pessoas. Felicidade, volto-me à ela. No jardim dos meus sonhos, a felicidade é plena. Mas não diria completa. Ainda me falta alguma coisa. Esse vazio, sempre me persegue. Já tentei, incansavelmente descobrir qual o motivo ou a origem deste vazio. Mas não encontro nada.
Seria da felicidade? Perguntas, perguntas e mais perguntas, me rodeiam a mente. Eu dou milhares e milhares de voltas, mas sempre acabo no mesmo lugar e me fazendo as mesmas perguntas. Sem respostas. Posso encontrá-las ou talvez, esquece-las e acreditar que todas essas dúvidas foram sanadas, quando me encontro junto ao meu amor. Enfim, um momento em que me sinto em paz e completa. Mas ainda sem a completa sensação de felicidade. Falta meu amor estar comigo para sempre, falta a presença dele em minha vida, todos os dias. Ainda que eu o tenha tão perto, graças a facilidade de um aplicativo chamado Whatt's App, sinto sua falta. E acredito que minha felicidade só será eternamente completa, quando eu puder ser lembrada com ele, quando todos os nossos sonhos se tornarem realidade.
E com a leitura deste livro, pude perceber que a felicidade, não é algo que se compra, não é algo que podemos sentir todos os dias ou que poderemos desfrutar para sempre. A felicidade precisa ser encontrada e encontrar. Ou ela pode estar em apenas um instante da vida. Instante este em que Macabea, a encontra no mesmo momento em que descobre o verdadeiro sentindo de sua vida, quando, simplismente, acredita em seu futuro e sente esperança de que as coisas vão melhorar. Clarice, como Rodrigo, soube revelar e nos contar minuciosamente, a história de Macabea, de maneira exemplar.
Posso afirmar que ao término da leitura e do filme inspirado no livro, eu realmente me senti feliz. Por um instante, talvez. Mas pelo simples fato de Macabea sorrir, e abrir os lábios com um brilho estonteante que me levou a crer que sim, felicidade existe e pode ser encontrada, até mesmo num último suspiro de vida.
Tábata Bueno.
sábado, 2 de novembro de 2013
Lavava as roupas, passava e botava lata d'água na cabeça
O que Sra. Marinalva mais queria era
levantar vôo batendo asas rumo a uma vida melhor em São Paulo. Enganada, seus
sonhos foram perdidos em meio a seres desprovidos de asas.
Tábata Bueno
Criada numa aldeia tranquila, fundada por índios da tribo Tupinambá, Sra.
Marinalva cresceu, viveu, casou-se e teve uma filha, Niquele, em Olivença na
Bahia. Ocupando-se de lavar roupas e passa-las para garantir seu sustento, Sra.
Marinalva botava lata d’água na cabeça do nascimento do sol até ao ocaso,
cruzando a aldeia dos índios Tupinambás, tateando com os pés descalços a mata
verde e rica pela natureza e entoando cânticos que escutara ao passar pela
tribo.
Analfabeta, com poucos dentes na boca, pele negra, traços indígenas e
fala caracterizada por aspectos regionais da Bahia, Sra. Marinalva prestara seu
“seuviço” cuidando das roupas de Sr. Edival, dono de uma das mercearias da
pequena cidade de Olivença, fundada no início do século XVIII, quando jesuítas
oficializaram a aldeia indígena dos Tupinambás.
Com 68 anos de idade, Sra.
Marinalva mantinha seu trabalho e seguia religiosamente sua rotina diária. Ao
pegar “camaradage” com Sr. Pedro e Dona Cissa, um casal de protestantes que
visitara a residência do Sr. Edival todas as semanas para realizar cultos, Sra.
Marinalva foi surpreendida com a proposta de ir para São Paulo para trabalhar e
viver em melhores condições das que ela vivia ali.
Impressionada com a ideia de conquistar uma vida melhor, Sra. Marinalva
imaginou-se como uma borboleta, que o vento tira para dançar, batendo asas em
uma das praias de Olivença, passando por piscinas de águas naturais, repleta de
peixes amarelos. Saiu às pressas, apanhou tudo o que tinha e deixou para trás a
família, sua grande companheira de “seuviço” a lata d’água e todos os cânticos
que entoara, do raiar do sol ao anoitecer.
Ao desembarcar na cidade cinza, Sra. Marinalva se sentira em outro mundo,
muito diferente do que estava habituada e havia imaginado. Prédios
arranha-céus, ruas movimentadas, pessoas passando para lá e para cá, numa
estranha correria, parecia que muitos queriam chegar à algum lugar com muita
pressa, ruídos da cidade se misturavam em breves sinfonias de buzinas, carros,
caminhões, motos, gritos de pessoas estressadas, músicas, sirenes, aviões,
trovões e helicópteros, todos formando uma melodia estranhamente harmoniosa com
a chuva que caia das pesadas nuvens cinzas. Sr. Pedro e Dona Cissa, de maneira
ríspida, quase que lhe arrancando as mãos, não pediram, exigiram-lhe seus
documentos.
– E quando chegou aqui, eles ficaram com tudo meu, cpf, roupa, dinheiro e
carteira de trabalho. – disse Sra. Marinalva ao relatar sua chegada à cidade
grande.
A partir deste dia, a vida da Sra. Marinalva não seria mais a
mesma. Seu sonho de voar e bater asas rumo à uma vida melhor, caia ao chão,
como um espelho em pedaços, ressoando ruídos tristes de sonhos perdidos.
Enganada, fora levada até um banco e obrigada a assinar papéis com seu nome (a
única coisa que aprendera escrever, em 68 anos de vida). Sr. Pedro e Dona Cissa
retiraram todo o dinheiro de sua conta, levando tudo o que havia conquistado
durante toda sua vida como lavadeira.
Com os pés atolados no asfalto frio e sujo de São Paulo, Sra. Marinalva
encontrava-se dormindo embaixo de um viaduto, com o pouco que lhe restara, um
cobertor surrado, uma caixa de papelão amassada, na qual se deitara e a roupa
do corpo.
Sr. Pedro, antes de partir com Dona Cissa, deixou Sra. Marinalva embaixo
do viaduto, dizendo-lhe:
- Sabe quando a senhora vai voltar para Olivença? No dia de “Sun nunca”! –
disse-lhe cuspindo saliva ao final.
Com seus
sonhos jogados por água abaixo, Sra. Marinalva deixara escorrer as lágrimas
pelo rosto, assistindo ao casal que a enganara, partir com tudo o que tinha.
A cada dia, milhares de carros,
ônibus e caminhões cruzavam aquele viaduto e Sra. Marinalva, sem rumo,
encontrava-se ali à pelo menos dois dias, quando Sra. Lenice, responsável por
um albergue de mulheres e crianças em São Paulo, pegou-se observando-a. Repleta de compaixão, estacionou seu carro no
acostamento da avenida e subiu o muro, abaixo do viaduto, aproximando-se de
Sra. Marinalva, perguntou-lhe:
- Olá a senhora precisa de ajuda? –
disse Sra. Lenice com um bonito sorriso nos lábios.
Sra. Marinalva encontrava-se triste,
aflita, com fome, sem convicção de que voltaria a bater suas asas naquele lindo
jardim que sonhara. Naquele lugar sujo, escuro, cinzento e vazio, avistava
apenas sonhos perdidos enquanto uma cólera lhe invadia o estômago. Levantando
os olhos para Sra. Lenice, Sra. Marinalva surpreendera-se com o lindo sorriso
que surgia de seus lábios. Nesse momento, sentiu que ainda em algum lugar,
havia um resquício de vida, que iluminava aquele instante. Reconhecendo que
Sra. Lenice queria apenas ajuda-la, Sra. Marinalva resolveu se abrir,
contando-lhe tudo o que havia acontecido.
- Num tenho nem mãe nem pai, só tenho do céu. Tenho sofrido muito. Vim de
Olivença, interior de Ilhéus, uma cidadezinha que não tem loja, só tem mercado
e farmáça. Morava com Dom Edival, daí peguei camaradage com o Sr. Pedro que
prometeu me trazer para São Paulo, dizendo que ía cuidar de mim. E quando
chegou aqui, eles ficaram com tudo meu, cpf, roupa, dinheiro e carteira de
trabalho. Mas antes me levaram no banco e me fizeram assinar uns papel. Saindo
do banco, Sr. Pedro e Dona Cissa, arrumaram tudo as coisa e foram-se embora, me
deixando aqui. Eu num fui junto, porque eles pudiam inté me matar. – disse com
lágrimas escorrendo lhe a face ao final.
Com os olhos cheios de lágrimas,
Sra. Lenice se compadeceu e convidou Sra. Marinalva para ficar no albergue.
Sra. Marinalva que se encontrava tão morta e esquecida, voltara a sentir o
bater de asas das borboletas em seus sonhos e permitia-se acreditar que ainda
havia uma oportunidade de voltar para casa.
Alojada então no “albergo”, desde
novembro de 2012, Sra. Marinalva rezava o “teuço” todos os dias pedindo ao
“Sinhô” que a ajudasse a se lembrar do endereço de sua casa, para que as
assistentes sociais do albergue pudessem encontrar uma forma dela voltar para
casa.
- E foi com
muito pelejar que eu me alembrei o nome da rua donde eu morava, Cráudio
Magalhães, com Dona Nivalda, que eu lavava a roupa. Daí eu me alembrei que eu
morava nesse lugar, em frente à praça, perto da Igreja Nossa Senhora da Escada
– contente, afirmou Sra. Marinalva.
Por meio de ligações e contatos
realizados na “infunete” (Internet), um dos assistentes sociais localizou sua
residência e conseguiu arrecadar fundos para comprar a tão desejada passagem de
volta para casa, na aldeia dos Tupinambás.
Após
viver dez meses no albergue, Sra. Marinalva deixara saudades. Mas enfim, lembrará
de criar asas todas as vezes que se deparar com sorrisos brilhantes e intensos,
como da Sra. Lenice que no instante de morte e perda de seus sonhos, surgiu
como uma luz no fim do túnel e retirou-a da escuridão, transformando as
lágrimas em sangue, que a manteve em pé para seguir e não desistir.
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